Cuidar da mente também é investimento no campo. A saúde mental do trabalhador rural precisa entrar de vez na agenda do agro — o Abril Verde e a nova NR-1 reforçam essa urgência

A lavoura não para. A criação exige atenção constante. A colheita tem hora. E, no meio de tudo isso, está o trabalhador rural — um dos pilares do agronegócio brasileiro — enfrentando, muitas vezes em silêncio, os impactos invisíveis do adoecimento emocional. Em abril, mês da campanha nacional por mais segurança e saúde no trabalho, é preciso acender o alerta: o sofrimento psíquico no campo é real, crescente e não pode mais ser ignorado.
A rotina do trabalhador rural envolve múltiplos fatores de risco para a saúde mental. A instabilidade climática e financeira, o isolamento das propriedades, a sobrecarga física, a exposição a produtos tóxicos, a ausência de apoio emocional e até o preconceito contra o sofrimento psíquico são elementos que se somam para criar um cenário preocupante. Estudos já indicam que mais de 40% dos trabalhadores do campo apresentam sintomas de transtornos mentais comuns, como ansiedade e depressão. E a tendência é de agravamento, sobretudo quando o cuidado com a saúde mental ainda é visto como tabu ou “fraqueza”.
A preocupação crescente com a saúde mental no ambiente de trabalho, em todos os setores econômicos, levou à atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), conforme estabelecido pela Portaria MTE nº 1.419/2024. A partir de 25 de maio de 2025, todas as empresas — inclusive as rurais — deverão incorporar os riscos psicossociais ao seu Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR). Isso inclui a identificação, avaliação e controle de fatores como estresse, assédio moral, jornadas exaustivas, violência psicológica e qualquer condição que comprometa o bem-estar mental dos trabalhadores.
A nova regra exige, de maneira objetiva, que empregadores rurais adotem planos de ação específicos para prevenir e mitigar esses riscos. Também será necessário capacitar equipes e lideranças, rever procedimentos internos, promover ambientes mais acolhedores e implementar medidas que favoreçam o equilíbrio emocional. Isso pode incluir, por exemplo, a criação de espaços de escuta, oferta de apoio psicológico, campanhas educativas e até ajustes organizacionais nas tarefas ou jornadas de trabalho.
Ignorar essas exigências pode gerar consequências sérias. O descumprimento da NR-1 poderá acarretar sanções administrativas, autuações por auditores fiscais e até ações civis públicas propostas pelo Ministério Público do Trabalho, com possível responsabilização judicial dos empregadores.
Mais do que um dever legal, cuidar da saúde mental dos trabalhadores rurais é uma escolha estratégica. Um ambiente de trabalho saudável e seguro melhora a produtividade, reduz o absenteísmo, fortalece vínculos e contribui para a sustentabilidade do negócio no longo prazo. A prevenção é, sem dúvida, o melhor caminho — e começa com a escuta, o respeito e a valorização de quem faz o campo acontecer todos os dias.
Abril verde é um convite à reflexão, mas também à ação. O campo não pode florescer onde há adoecimento. E hoje, mais do que nunca, saúde mental também é ferramenta de trabalho.

Alice Cardoso,
sócia do escritório Cardoso Damacena Advogados,
especialista em Direito do Trabalho no Agro
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